Essa semana terminou pra mim com um clima de nostalgia total. Tudo porque na quinta-feira fui ao Bolshoi Pub, conceituada casa de shows de Goiânia, conferir um show especial da banda The Four Horsemen, uma das mais celebradas covers de Metallica do país. O show foi muito bom, como não podia deixar de ser, e os marmanjos balzaquianos presentes puderam reviver a adolescência ao escutar os maiores clássicos de uma das maiores bandas de metal do mundo. Voltando pra casa e remexendo nos meus CDs antigos procurando os do Metallica, comecei a ouvir novamente alguns clássicos que me fizeram arrepiar durante a adolescência.
Foi daí que surgiu a ideia deste post. Reunir e indicar alguns álbuns que fizeram história no mundo do heavy metal e que me marcaram. A objetivo é servir de guia para quem está começando no estilo, e para quem viveu essa época como eu, matar um pouco da saudade. Hoje o gênero metal parece ter encolhido um pouco. Os mainstreans continuam no topo, claro. Mas as bandas de porte médio parecem ter desaparecido e perdido espaço, além de poucas bandas novas surgirem. O palco parece ainda dominado pelas que surgiram na década de 80, e tentam sobreviver ainda hoje graças aos fãs antigos e um ou outro novo fã. Mas o fato é que pra quem viveu o cenário metálico das décadas de 90 e 2000, o cenário de hoje nem se compara. Shows todo fim de semana, bandas locais surgindo a todo momento e tocando muito (mesmo que em espaços modestos como o extinto DCE da UFG), revistas especializadas que nós corríamos toda semana nas bancas pra comprar e a troca de CDs e fitas gravadas entre amigos com o que havia de mais novo no cenário metálico mundial. Esta era a vida de um bom metaleiro, sem contar as idas ao centro pra comprar coturnos e camisas de bandas. Bons tempos.
Lembro que meu primeiro contato com o Metal foi na extinta Escola Técnica Federal de Goiás (hoje IFG). De tanto ouvir os amigos falarem sobre o gênero, um dia passando pelo centro comprei duas fitinhas cassetes (imagina, hoje as crianças nem sabem mais o que é isso). Uma era do Iron Maiden, e o álbum em questão era o Virtual IX. Na época nem imaginava da rixa e das polêmicas com o vocalista deste disco, Blaze Bayley. A outra era do Metallica, e na capa trazia uma foto dos quatro integrantes. O conteúdo era o chamado Black Album, mas isso só fui descobrir anos depois. Lembro que minha sensação ao ouvir a fita do Iron foi ficar espantado. Os riffs, aquele som pesado mas tecnicamente muito superior a tudo o que já tinha ouvido. Foi uma descoberta espantosa. Depois disso passei a comprar mais e mais fitas do gênero e a procurar outras bandas que me causassem sensações parecidas com aquelas. Não parei mais. O próximo passo foi comprar um coturno e ir ao DCE, local onde todos falavam que bandas locais tocavam aquele tipo de som. Em meio à escuridão e desolação do local, às pessoas estranhas, cabeludos balançando suas cabeleiras, eu, um então jovem de 17 anos de classe média, me senti em casa. Passei a frequentar toda semana e a me considerar, oficialmente, um metaleiro.
Isto foi em 1998. Depois disto comecei a procurar e a buscar mais e mais bandas de metal. Devorava revistas como a Rock Brigade e a Roadie Crew toda semana. Foi o início também da popularização de algo que iria mudar o mundo como conhecemos: a internet. Com ela vieram os blogs. Comecei a escrever resenhas de shows e publicar num blog que criei na época, o GO in Hell. Queria ser jornalista. Tomei outros caminhos, mas o prazer pela escrita continuou, e por isso estou aqui até hoje. Entre os álbuns que passei a ouvir e conhecer, alguns me marcaram profundamente, e hoje, ao escutá-los, a nostalgia é grande.
Apesar do Black Album e do Virtual IX terem sido os primeiros álbuns que ouvi do Metallica e do Iron Maiden, as duas melhores bandas de Heavy Metal do mundo naquela época (Black Sabbath e Judas Priest naquela época eram vistos por nós como os vovôs do Metal, bandas lendárias que reverenciávamos mas não substituíam os pais do estilo, Iron e Metallica), não foram eles que me marcaram. Alguns anos depois, passando por uma liquidação das Americanas, comprei aquele que seria o álbum definitivo do Metallica pra mim. Na capa, uma estátua da Justiça, com seus olhos vendados e as tradicionais balanças faziam alusão ao seu título: ...and Justice for All. Durante a audição do mesmo, a impressão era que havia descoberto uma das obras primas, não só da banda, como do gênero em geral. And Justice For All pode ser considerado um dos grandes trabalhos de Heavy Metal de toda a história. O álbum é denso, pesado, com uma bateria nervosa e bem trabalhada, riffs lentos mas na medida certa, e canções históricas. One, Blackened, Harvester of Sorrow e a própria And Justice For All mostram tudo isto. O álbum tem uma sonoridade única, as músicas começam lentas e adquirem velocidade no meio. Todas as músicas são de uma complexidade impressionante. Pra se ter uma ideia não tem música menor do que 5 minutos. Todas são extensas sem ser chatas. Pra mim a obra definitiva do Metallica.
Já do Iron Maiden, seu álbum definitivo fui conhecer também alguns anos mais tarde. Meu objetivo era fazer uma coleção com todos os CDs da banda. Fui comprando aos poucos, até chegar naquele que se tornaria meu favorito. O álbum em questão é o Seventh Son of a Seventh Son. A capa era uma das mais bonitas, trazia o Eddie (mascote da banda) só com a metade do corpo segurando o próprio fígado (ou seja lá que parte do corpo seja aquela), num cenário todo gelado. A primeira música era Moonchild. Começava lenta e de repente descambava pra um riff acelerado (as famosas cavalgadas) e um refrão dos mais bonitos da história. Durante toda a música, chamava atenção algo que não era muito comum nos álbuns anteriores: o uso de teclados pra dar um clima atmosférico nas músicas. No álbum todo eles abusam desse efeito, e o resultado é excelente. Bruce Dickinson está em sua melhor fase aqui, deixando de lado aquele agudo esganiçado que o marcava nos primeiros álbuns (como em The Number of the Beast), e assumindo uma voz mais potente e balanceada. Na edição do álbum que comprei ainda vinha um CD extra com algumas músicas antigas da banda, em novas versões na voz de Bruce. Charlote the Harlot e Prowler me conquistaram na hora. Mas a melhor música, aquela que viria a se tornar uma de minhas favoritas da banda, era a segunda faixa do álbum: Infinite Dreams. Uma melodia belíssima, com uma letra que fala sobre reencarnação e espiritualismo. Uma obra prima. O único ponto negativo deste álbum é uma música que simplesmente não suporto ouvir, e que até hoje ainda pulo sempre que coloco esse álbum no player: Can I Play With Madness, que tem o refrão mais chato da história da banda. Nem tudo é perfeito como se vê.
Um tempo depois, já introduzido definitivamente no universo metal, ouvi falar de uma banda brasileira que, diziam, era uma das melhores do ramo. Com seus músicos todos formados em música clássica, dizia-se que a banda misturava música clássica com metal e até música brasileira. Fiquei curioso, e eis que um dia passando por uma loja do ramo, adquiri, sem nunca ter ouvido, um álbum da mesma. A capa era uma das coisas mais lindas que já tinha visto: trazia um mapa histórico do Brasil, com uma bússola toda estilizada no meio. Holy Land era o título do disco, e a banda em questão era o Angra. Chegando em casa fui ouvir o disco nos fones de ouvidos, como eu gostava de fazer (é melhor pra perceber os detalhes das músicas). Começava com uma introdução de canto gregoriano. "Isso aqui é coisa fina", pensei. No fim da introdução, alguns barulhos de trovões e tempestade preparavam o clima pro que viria. De repente começava um riff cadenciado, pesado, mas ao mesmo tempo diferente, com uma batida que lembrava ritmos regionais, forró, baião, mas sem soar brega. Tudo casava de forma perfeita. Violinos ao fundo davam o clima, e de repente tudo parava, vinha um riff de guitarra sozinho e voltava novamente pra levada anterior. Quando começava o vocal, meu amigo, aí que tudo pirava de vez. Uma voz limpa, aguda, mas bem balanceada. O vocalista em questão, em sua melhor fase, era André Matos, e a música, Nothing to Say. Até hoje arrepio quando a ouço. E o resto do disco era uma pedrada atrás da outra. O ápice era a belíssima Carolina IV, a mais ousada do disco, que começava com uma batida de Olodum (!). Na época lembro que os mais ortodoxos torciam o nariz pra este disco pelas experimentações em demasia. Eu achava aquilo sensacional, de uma genialidade extrema. E ainda acho até hoje, tanto que este é o disco que não pode faltar na minha cabeceira. Pesquisando a história desta banda, descubro que ela era remanescente de uma outra banda anterior que havia existido até o final da década de 80, e que lançou um dos melhores trabalhos do metal melódico nacional e mundial: tratava-se do Viper, e o trabalho em questão é o Theatre of Fate, que já trazia em si muitos dos elementos que seriam utilizados pelo Angra posteriormente: a música clássica, os violinos, cantos gregorianos, etc. Theatre of Fate é uma obra prima pois todas as músicas são excelentes, como já destaquei aqui no Blog anteriormente.
Continuando nosso giro, o próximo álbum que conheci e me marcou foi de uma banda que na época todos consideravam o supra sumo da virtuosidade do metal mundial. Conheci-a vendo vídeos na casa de amigos, que destacavam a técnica dos músicos, especialmente do baixista, John Myung, e do baterista Mike Portnoy. O primeiro CD que ouvi foi emprestado, e se chamava Metropolis Pt. 2: Scenes from a Memory. O álbum temático conta a história de um jovem que faz uma regressão para descobrir alguns fatos de sua vida passada. Musicalmente ele mescla partes rápidas e pesadas com outras tão leves e melódicas que mais parecem uma valsa. Partes quebradas e retomadas, mudanças de ritmos, solos e mais solos, além de um vocal dos mais belos, tudo isto são a marca do Dream Theater. Aqui tudo se encaixa com tanta perfeição, que eu ficava o dia todo ouvindo e re-ouvindo este CD.
Outra que conheci através de um CD emprestado foram os estadunidenses do Iced Earth. A capa do disco trazia um monstro com dois cachorros atacando, e o título era emblemático: Something Wicked This Way Comes, o que denunciava uma temática maligna das músicas (coisa que todo metaleiro adora). A sonoridade do Iced Earth é algo espantoso. Os riffs das músicas são extremamente pesados, com palhetadas rápidas (na época a gente brincava que o Jon Schaffer tinha a palhetada mais rápida do mundo, e ainda hoje acredito que isso seja verdade). O vocal grosso, mas sem soar gutural era outro diferencial do grupo. Pra quem estava acostumado com os vocais agudos dos melódicos, era uma inovação e tanto. Todo o álbum é baseado na mescla de músicas pesadas com espécies de baladas, músicas mais leves. Ele mescla uma música de cada estilo até o seu final: uma rápida, uma lenta, uma rápida, uma lenta, etc. Uma dessas baladas, Watching Over Me logo se tornou nossa favorita (minha e de alguns amigos), sendo eleita a música pra se tocar no violão favorita nas festinhas. Mas o grande destaque do álbum era a trilogia que o encerrava: três músicas que tratavam sobre a mesma temática: o nascimento do anti-cristo, desde a profecia (Profecy), passando pelo nascimento (Birth of the Wicked) e chegando ao domínio do mundo (The Coming Curse). Musicalmente eram belíssimas, verdadeiras obras primas.
Aos poucos, à medida que descobríamos mais bandas e conhecíamos os diferentes estilos (Heavy Metal, Melodic Metal, Power Metal, etc), logo nos deparamos com três dos estilos mais controversos deste universo. Os mais pesados. Inicialmente era difícil se acostumar com o vocal gutural. Lembro que a primeira vez que ouvi o Sepultura não gostei. Aquele tipo de vocal me causava estranheza, e não conseguia ver qualidade. Foi uma outra banda então que abriu caminho para o estilo. Um dia nas promoções das Americanas achei um álbum de uma tal Pantera. Já tinha ouvido falar da banda e sabia que era de metal, mas nunca havia ouvido. Resolvi comprar mesmo sem saber como era. E qual não foi minha surpresa quando cheguei em casa: um disco sujo, pesado, com um vocal gutural, mas não como o do Sepultura, mais rasgado, com músicas cadenciadas e outras mais rápidas. Após umas duas audições e ter me acostumado com a sonoridade, já não conseguia deixar de ouvir a banda. O álbum em questão era Vulgar Display of Power, pra mim a obra prima do grupo. Depois dele comecei a ouvir vocais guturais com mais simpatia. Foi a porta de entrada pro universo do Thrash, Death e Black Metal.
Foi hora então de encarar o Sepultura. O próximo disco foi um que peguei emprestado com alguns amigos: a capa trazia uma espécie de vulcão ou sei lá o que, com um olho no meio: era o Arise.. Logo na primeira música já percebíamos que a coisa era séria: velocidade e quebradeira, riffs insanos e uma bateria ultra-rápida e recheada de viradas espetaculares de bateria. Eram os irmãos cavaleira fazendo minha cabeça. Depois disso não consegui mais deixar de ouvir os caras. Quando fui num show deles então pela primeira vez, Sepultura passou a ser um dos grandes ícones do metal nacional e mundial pra mim. E o é até hoje.
Já que havia me acostumado á sonoridade do Thrash e Death Metal, foi hora de embarcar no estilo. Duas bandas então passaram a fazer minha cabeça, já na época do MP3 e dos PCs. A primeira foi o Testament, quando descobrimos o álbum The Gathering, que marcava uma virada na carreira da banda, pra uma sonoridade mais agressiva. A primeira faixa do disco, D.N.R., sigla de Do Not Ressucitate já agradava de cara. Era uma pedrada. Um riff rápido, uma bateria veloz e cheia de viradas e um vocal gutural mas diferente de todos os outros. E a qualidade continuava em todo o disco. Uma quebradeira só. Até hoje quando ouço este disco minha vontade é de sair batendo cabeça insanamente. O outro disco que marcou o estilo, especialmente depois que seu líder e principal compositor, Chuck Schuldiner morrer de câncer precocemente, foi The Sound of Perseverance, de uma banda chamada Death. Em toda sua carreira o Death praticava um death metal correto e similar às outras bandas do gênero. Mas aqui os caras inovaram. Resolveram injetar um pouco de virtuosismo nas músicas, e o resultado foi um Death Metal quebrado, cheio de viradas, mudanças de ritmos, variações e mesclas de velocidades, além de riffs poderosos, a melhor bateria de que já se teve notícia e um vocal gutural rasgado muito nervoso. Ouça Scavenger of Human Sorrow, música que abre o disco, e entenderá o que estou falando. Este disco coloca o Death Metal em um novo patamar de qualidade sonora, e deixa no chinelo a maior parte dos lançamentos do gênero nas últimas três décadas. Um marco.
Hoje vemos poucos lançamentos do gênero metal. A maioria são destas mesmas bandas que continuam tentando sobreviver em meio ao predomínio do pop e da música mais, digamos, comercial. Mas os fãs ainda existem, e a esperança é de que novos surjam. E a estes novos fãs que surgem, só o que digo é para que busquem conhecer a história do estilo, como eu fiz um dia. Sei que talvez os discos que me marcaram não sejam os mesmos que marcarão vocês. Mas com certeza descobrirão muita coisa boa nesse passado.
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