
Enquanto muitos aplaudiram a reação de Daniel Alves, alguns o criticaram por banalizar o ato racista, alegando que racismo não é coisa para se rir, e que o caso deve ser tratado com seriedade e punições exemplares, não com galhofas. Não creio que o jogador esteja muito preocupado com tudo isto. Após o jogo, Daniel Alves complementou seu ato dentro de campo com duras declarações a respeito da torcida espanhola: "Estou há 11 anos na Espanha, e são 11 anos iguais. Tenho que rir desses retardados". Uma constatação dura e triste ao mesmo tempo, de alguém que sabe bem do que está falando por ter sentido na pele. Então não acho que seja o caso de reprovar a galhofa de Daniel Alves. Ao comer a banana jogada por um racista, o jogador conseguiu trazer os holofotes para o fato e gerar um buzz que não aconteceria caso não tivesse feito nada.

Assumir um estereótipo negativo com o intuito de ressematizá-lo de forma positiva é uma estratégia válida de luta contra preconceitos. É o que acontece com o termo "macumba", por exemplo, que durante vários anos foi um termo usado pejorativamente para se referir de forma negativa às religiões afro-brasileiras, e agora vem sendo adotado por estas mesmas religiões afro como forma de se auto-identificarem, tentando trazer uma positividade ao termo: "somos macumbeiros sim, e daí". Neste caso, a reversão da semântica negativa atribuída ao termo talvez se deva ao fato de que ele não é utilizado para se referir a nenhum outro significante, não tem qualquer outro significado em nossa língua.

O exemplo mais explícito desse jogo de concessão e subversão era o “bloco do sujo”, ou seja, as pessoas que saíam vestidas com fantasias velhas e máscaras como se estivessem prontas para brincar o velho Entrudo. Vários ranchos cariocas tinham os seus “sujos”, que se vestiam sem qualquer luxo, brilho ou alegorias. O “sujo” de Tia Ciata era conhecido como “o macaco é outro”. Esse era o refrão que os participantes gritavam depois de colocar a mão nas máscaras, gozando da própria cor, e dizer baixinho “nós somos gente”, para em seguida gritar bem alto: “o macaco é o outro”. Talvez a ironia da brincadeira não fosse notada pela polícia, mas para os foliões era claro que o Carnaval inspirado na Europa não excluía a bem humorada crítica social.
Talvez devêssemos aprender com Tia Ciata e seu "bloco do sujo", que já na década de 20 no Brasil nos ensinava quem são os verdadeiros macacos nesta história.
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Referência:
ALBUQUERQUE, Wlamyra R. de. FILHO, Walter Fraga. Uma história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais; Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2006. (Disponível on-line em: http://www.ceao.ufba.br/2007/livrosvideos.php)
Outros artigos sobre o tema:
Sobre macacos, bananas, Daniel Alves e Neymar: Não somos macacos, porra!
Campanha #SomosTodosMacacos pode reforçar racismo, diz especialista
Contra o racismo nada de bananas, nada de macacos, por favor!
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Referência:
ALBUQUERQUE, Wlamyra R. de. FILHO, Walter Fraga. Uma história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais; Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2006. (Disponível on-line em: http://www.ceao.ufba.br/2007/livrosvideos.php)
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