5 de ago. de 2009

Cabra Marcado para Morrer

Nosso povo tem a fama de ser um povo pacífico, ordeiro, que mesmo com todos os problemas, ao invés de se queixar, samba, faz carnaval. Mas olhando um pouco mais atento nossa história, veremos que não é bem assim. Já tivemos importantes movimentos sociais de luta, seja política, seja por terra, por melhores condições de trabalho. O problema é que esses movimentos são sempre abafados e nunca chegam ao conhecimento das massas. E, me pergunto, mesmo que chegasse, até que ponto iriam conseguir mobilizar nosso povo de que é preciso ir à luta se quisermos mudar alguma coisa? A força ideológica do conformismo hoje é muito grande, e acaba por desmobilizar qualquer tentativa revolucionária de mudar alguma coisa.


Para estes, aconselho este vídeo intitulado Cabra Marcado Para Morrer, uma obra prima do cinema nacional. Comecemos pela história. Na década de 50, um grupo de camponeses se une e forma uma liga camponesa para lutar contra a opressão dos grandes latifundiários. Isto ocorre no sertão da Paraíba, mais precisamente nos municípios de Galiléia e Sapé. Aos poucos estes camponeses começam a se mobilizar e a procurar seus direitos, procuram advogados e começam a enfrentar os grandes coronéis da região, que mandavam e desmandavam nas fazendas, cobrando impostos e desapropriando as famílias como bem entendessem. Logo o líder dos camponeses é identificado como sendo João Pedro Teixeira, que acaba sendo morto por policiais contratados pelos coronéis.

Esta história desperta o interesse do cineasta Eduardo Coutinho, que vai para a região na década de 60 para gravar um filme sobre a história de João Pedro e da liga camponesa. Reúnem os atores entre os próprios moradores do local, inclusive a própria viúva de João Pedro interpreta ela mesma no filme, e começa a gravar. O tal filme desperta desconfianças por parte do governo e dos coronéis, que sempre acusam os cineastas de serem cubanos comunistas que estão induzindo os camponeses e tentando implantar a revolução no local (!). A pressão aumenta no local, e o início da ditadura militar em 64 acaba fazendo com que os cineastas tenham que interromper as gravações, após terem grande parte de seu material apreendido e de serem muito ameaçados. Vários camponeses no local são presos e torturados, acusados de comunismo, e vários são obrigados a fugir e a se exilar.

Dezessete anos depois, na década de 80, os cineastas voltam ao local onde tudo aconteceu para tentar reencontrar os personagens desta trama. Eles mostram as cenas que sobraram do filme que seria gravado aos atores, e colhem entrevistas sobre suas lembranças da época e sobre sua vida depois do ocorrido. Estas entrevistas estão reunidas neste documentário, que do filme original (que nunca foi finalizado) só guardou o título. Trata-se de um relato sincero e honesto, e muito bem feito, onde os autores deixam os próprios personagens da história toda falarem o que lembram, o que sentem, intercalado pelas cenas do filme gravadas na época. Aos poucos a história vai se desenrolando e o telespectador vai conhecendo a trágica história de João Pedro, sua família e os camponeses, perseguidos e torturados. Este documentário ganhou vários prêmios, nacionais e internacionais, e está entre os melhores documentários já produzidos por aqui.

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